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Apadrinhados políticos comandam cartórios

Nepotismo


Resolução do TRT prevê que chefias de varas do Trabalho devem ser ocupadas por servidores de carreira bacharéis em direito, escolhidos pelos juízes, mas o próprio tribunal descumpre a norma

O flagrante desrespeito à legislação atinge até mesmo normas criadas pelo próprio Tribunal Regional do Trabalho (TRT) – artifício que garante a apadrinhados políticos cargos de chefia de vários cartórios da Justiça de 1º instância. Datada de 2003, uma resolução do TRT prevê que as vagas devem ser ocupadas por funcionários de carreira bacharéis em direito, escolhidos pelos juízes, com quem os servidores terão contato direto. Até 2003, a norma interna era que as indicações deveriam ser feitas pelo presidente do tribunal.

Mas seis anos depois da nova regra, esse processo de substituição caminha a passos lentos. Comarcas como a de Pedro Leopoldo, Santa Luzia, Patos de Minas, Nova Lima e até mesmo varas da capital têm como chefes de cartórios pessoas que não se enquadram nas exigências da resolução. Os servidores têm salário considerável para a realidade brasileira: cerca de R$ 10 mil mensais, sem considerar benefícios adquiridos ao longo do tempo.



Segundo o site do TRT, Sílvia Regina Dias Moreira é chefe de cartório em Pedro Leopoldo e, coincidência ou não, irmã do deputado federal Márcio Reinaldo (PP). Munira de Freitas Bejjani, é chefe de cartório da 31ª Vara de Belo Horizonte. Ela é irmã do ex-secretário-geral do TRT, Samir Bejjani, hoje aposentado. Ele cuidou também, conforme a ação que tramita no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, dos interesses de sua cunhada Ana Cecília Bejjani.

De acordo com a sentença, Ana Cecília fez concurso para a prefeitura de Papagaios, Região Centro-Oeste, a 151 quilômetros de Belo Horizonte, mas foi requisitada para trabalhar no TRT, em Belo Horizonte. Seu nome consta entre os 94 servidores que deveriam ser demitidos, há dois anos, não só em razão da manobra para burlar a exigência de aprovação em concurso para o TRT, mas também pela relação de parentesco com o ex-secretário-geral.



O TRT, por meio de seu diretor geral, Luís Paulo Garcia Faleiroreconhece que a decisão do próprio tribunal não foi totalmente implementada, passados seis anos, porque “alguns desses servidores atendem as necessidades dos juízes, que são quem têm poder hoje para solicitar a substituição do servidor. Portanto, se isso não ocorre é porque ela é desnecessária”. Faleiro não informou o número de comarcas que descumprem a resolução do tribunal, mas garantiu que “são poucas”.

Segundo ele, para a substituição, é necessário o pedido do juiz e a aprovação pelo órgão especial do TRT, o que ocorre sempre que solicitado. “Não existe descumprimento da resolução, porque as regras para ocupar esse cargo – ser funcionário de carreira e bacharel em direito – só valem para as novas nomeações. A lei não retroage para prejudicar”, explicou Faleiro. E completou: “Os dois servidores estão no cargo legalmente e há muito tempo. Foram nomeados, entretanto, em outra administração”.

Reforma administrativa causa descontentamento

Não bastasse o nítido tráfico de influência política em seus quadros de servidores, uma reforma administrativa em andamento no TRT de Minas vem causando também profundo descontentamento entre juízes e funcionários. A Resolução 37, de abril passado, aumenta de quatro para seis as funções remuneradas de assessores nos gabinetes dos desembargadores, com salários de cerca de R$ 4,7 mil. O cargo FC 6, entretanto, só existe na estrutura das varas de 1ª instância naquelas comarcas que têm foro e com previsão de uma única vaga.

Para conseguir fazer as mudanças sem que isso significasse aumento de despesas, o TRT extinguiu 379 cargos de FC 05, com remuneração de R$ 3,43 mil, e criou outros 161 FC 06, que vão reforçar os gabinetes dos desembargadores. Além desses, foram extintos outros 89 cargos de FC 01, com salário de R$1,56 mil, e outros 503 de FC 03, com remuneração de R$ 2,12 mil. Uma reforma que, para os descontentes, significa na prática, uma mexida para reforçar a estrutura da Justiça de 2ª instância e a manutenção do processo de sucateamento da 1ª instância, onde é evidente a falta de estrutura para o adequado atendimento à demanda que tem sua parte mais visível no excessivo número de processos nas varas.



Atentados E é nesse cenário que se acende a luz amarela de atenção. Somente nos últimos dois anos, quatro comarcas foram alvo de atos de vandalismo ou atentados contra juízes no interior do estado. O mais recente deles aconteceu na única vara do Trabalho de Ribeirão das Neves, na região metropolitana da capital, na madrugada do último dia 4, que foi incendiada. A vara, que funcionava no primeiro andar de um prédio de três andares, tinha cerca de 3 mil processos em tramitação. As causas ainda não estão claras, mas a primeira suspeita era de que alguém tenha quebrado o vidro e atirado dois artefatos dentro da sala. Entretanto, peritos da Polícia Federal consideram também a possibilidade de curto-circuito, e parte da fiação está sendo analisada.

A juíza Cristiana Fenelon, que preside a vara, optou pelo silêncio. Recusou-se a falar ao Estado de Minas , mas em entrevista ao site da Associação dos Magistrados do Trabalho (Amatra), ela diz que toda a fiação foi recentemente trocada e mais: que a segurança de juízes e servidores precisa ser reforçada. “Somos um anteparo da sociedade civil, principalmente depois da Constituição de 1988. O juiz muitas vezes tem que se responsabilizar, sozinho, pela efetividade de muitos direitos. Mas o Estado, nem sempre, nos oferece reais condições para tanto e o volume de processos não para de crescer.”



Em novembro, de acordo com o TRT, a juíza formalizou a contratação de um segurança para o local. Desde 2006, juízes do Trabalho de Barbacena e Muriaé, além de Contagem, foram ameaçados, de diferentes formas. Em 20 de outubro daquele ano, o fórum trabalhista foi incendiado e gerou um movimento nacional pela segurança da magistrada. Depois, em Muriaé, um bilhete ameaçador foi colocado no carro do juiz. Depois, em 30 de julho passado, em Contagem, um homem revoltado com o desfecho de seu processo pôs fogo na vara do trabalho. Apesar das ocorrências, o TRT, que admite não ter condição de oferecer segurança adequada a todos sob a alegação de aperto no orçamento, considera que os casos não passam de fatos isolados.

“Ainda não podemos falar que o que aconteceu em Ribeirão das Neves foi um atentado. Existe uma pequena chance de ser um curto-circuito. O fogo foi de pequena proporção e atingiu apenas o balcão, onde estavam algumas precatórias “, garante Faleiro. O TRT informa que ainda não fez o levantamento dos processos destruídos, mas cerca de 3,5 mil estava em tramitação naquela vara, que só voltou a funcionar na última segunda-feira.

Fonte: Jornal Estado de Minas
(Incluída em 18/03/2009 às 10:34)

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