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Lucrativa indústria dos concursos

TRABALHO


A busca de estabilidade no emprego leva, todos os anos, cerca de 5 milhões de pessoas a se inscreverem em concursos públicos em todo o país, um mercado que movimenta R$ 1 bilhão, entre taxas de inscrições, que variam de R$ 20 a R$ 150 e garantem metade desse montante às bancas examinadoras, além de cursos preparatórios e editoras que publicam apostilas, uma dupla que abocanha R$ 150 milhões. Os números da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac) impressionam e confirmam que a lucrativa indústria dos concursos vive uma fase mais do que próspera. Em 2007, a história não muda. Até o fim do ano, cerca de 100 mil vagas serão abertas, 47% delas na esfera federal.

No entanto, são muitas as queixas de candidatos em relação ao tempo que esperam a nomeação, pois passar nos testes não significa emprego imediato. Na Assembléia Legislativa, o deputado Elmiro Nascimento (DEM) apresentou Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que obrigaria o poder público ou órgão responsável pelo concurso a preencher as vagas anunciadas antes que o prazo de validade do processo de seleção expire.

Aliados à falta de oportunidades na iniciativa privada, esses são os principais motivos que levam profissionais a desistirem da área inicialmente escolhida e partirem para os estudos. O advogado Marcelo Burgel, que dá aulas de gramática, produção e interpretação de texto e direito em um curso que leva seu nome, confirma a transferência desses profissionais. Tenho alunos dentistas, advogados e psicólogos que estão dispostos a deixar os escritórios de lado para entrar no serviço, motivados pela estabilidade, aposentadoria, 13º salário, fins de semana e feriados , conta.

O próprio Burgel é um exemplo das inúmeras possibilidades que o setor permite. Formado em direito em 1998, desde 1993 ele dá aulas em cursos e conquistou o seu próprio negócio um ano depois do bacharelado. Estudei por conta própria para os concursos que fiz, como para o Tribunal de Contas do Estado e para a Prefeitura de Contagem, sempre conciliando com as aulas que ministro. Fui aprovado em 2001 para o Tribunal Regional do Trabalho, onde fiquei até 2003 , afirma. Depois de três anos no TRT, ele pediu exoneração do cargo para se dedicar ao curso. As pessoas ficaram assustadas com a minha decisão, mas pensei que, se quiser voltar depois, eu consigo, porque já domino a matéria. A minha satisfação com o curso preparatório é muito maior. A realização profissional que tenho aqui dificilmente teria em qualquer concurso. Tenho alunos que são aprovados nos primeiros lugares, um resultado melhor que o meu. Esse retorno é incrível , diz.

Um dos alunos de Burgel é Jorge Severino Mindêllo, de 38 anos. Formando em história e com pós-graduação em patrimônio cultural, ele confessa que, se pudesse optar, permaneceria na sua profissão. Gostaria de estar lecionando e de ser bem remunerado por isso, mas o que consegui desde que me formei, em 2000, foram apenas substituições de colegas. Sobrou muita desilusão por não obter respostas dos lugares que enviei currículo. Cheguei a tentar um concurso para professor do estado, logo depois de formar, mas ele acabou sendo anulado , conta. Frustado, ele brinca que virou capitalista. Na verdade, um cargo no serviço público é a minha melhor opção. Paga um bom salário e tem as vantagens que todo mundo conhece, inclusive a possibilidade de trabalhar em outro lugar , explica.

Mindêllo conta que, em dois anos de estudo, já investiu mais de R$ 3 mil e vem obtendo resultados melhores a cada tentativa. Fiz os concursos do Tribunal Regional Federal e dos ministérios públicos da União e do estado e, apesar de não ter passado, consegui aumentar o meu percentual de acertos. O próximo que vou tentar é o do Tribunal de Justiça de Minas 2ª Instância , conta, referindo-se ao concurso que prevê 762 vagas para técnico e oficial judiciário, 2º e 3º graus, com salário de até R$ 2.337,78.

A rotina diária é intensa, intercalando aulas no cursinho e estudo em casa com atividades físicas para aliviar a tensão. Nos fins de semana também tenho aulas, estudo em casa e participo de um grupo de estudo na Pampulha com mais quatro pessoas. A minha intenção é, assim que conseguir passar em um concurso, tentar outros com remunerações melhores. Penso até em fazer um curso de direito para tentar nível superior, que pagam bem mais , diz.

Por outro lado, Sabrina Maciel Ferreira Gontijo, de 27, está satisfeita com o cargo que conseguiu. Sem perspectiva ao fim do curso de administração de empresas, ela passou quatro anos dedicando-se exclusivamente a estudar para concursos. Fiquei sem saber que direção tomar, porque o curso que optei é muito concorrido e amplo, parece que não somos especialistas em nada. Decidi investir em concursos, estudando por conta própria. Comprei muitas apostilas e livros, alguns por mais de R$ 100 e fiz apenas um cursinho de português , conta.

Sabrina explica que também aproveitou o tempo para fazer cursos de outras línguas, como inglês e espanhol, o que ajudou a ampliar o seu currículo. Em 2006, ela foi aprovada no concurso dos Correios, o segundo que prestou para a empresa. Tinha feito um em 2004 e não me classifiquei. Vi que precisava estudar mais e no concurso do ano passado fiquei em quarto lugar. Fui chamada depois de quatro meses de espera e estou satisfeita. Foi realmente a minha melhor opção e vejo que posso crescer aqui dentro, ter oportunidades que fazem todo o esforço valer a pena , anima-se.

Angústia à espera da nomeação

Os candidatos dedicam anos de estudos e abdicações para conquistar uma vaga no funcionalismo público, mas nem tudo vira céu de brigadeiro para os aprovados. O que muitos raramente imaginam durante a preparação para as provas é que, em caso de aprovação, a convocação pode demorar um bom tempo, que invariavelmente causa angústia e incertezas. Aprovada em um concurso da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), em 2004, uma candidata que não quis se identificar tenta insistentemente obter respostas sobre a nomeação, que até hoje não foi efetivada.

O edital previa uma única vaga, concorri com mais de 300 candidatos e conquistei a primeira colocação no cargo, depois de muito esforço. Na época, não estava empregada e passava quase 8 horas estudando direto. Comprei apostilas e investi tempo e neurônio. A inscrição foi R$ 40, porém, como não dispunha de boa condição financeira, consegui isenção da taxa , conta.

Depois da aprovação, ela começou a ligar para a companhia, recebendo sempre a mesma informação de que não há previsão para a convocação. No começo, eu ligava toda semana, depois resolvi ligar todo mês. Hoje envio e-mails e, de três em três meses, telefono. Já questionei a demora da convocação e a informação que obtive é de que ainda não houve liberação da vaga, mas que certamente serei chamada. Na angústia, indaguei até se havia possibilidade de o concurso expirar e eu não ser convocada, mas me garantiram que, se a empresa divulgou a vaga, é porque irá preenchê-la¨, conta.

Por e-mail, a companhia informa que o concurso tem validade até 15 de junho de 2008 e que a contratação dos aprovados será feita assim que a unidade administrativa, detentora da vaga, solicitar a admissão. De acordo com a Copasa, a convocação poderá ser feita por meio de telegrama ou de carta com Aviso de Recebimento. É um absurdo que candidatos aprovados dentro do número de vagas tenham que esperar tanto tempo para ser empossados. Criamos uma rotina especial toda voltada para a conquista de um emprego e, quando finalmente achamos que conseguimos, nos deparamos com a demora na convocação e a incerteza da sua concretização , desabafa.

Para a candidata aprovada, todo o Brasil deveria adotar a Lei dos Concursos (Lei 3.964/07), em vigor no Distrito Federal, que prevê a garantia de nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital; a limitação do valor da taxa de inscrição a 1% da remuneração oferecida para o cargo e a flexibilização do prazo mínimo entre a publicação do edital e a aplicação das provas.

Anpac quer normatizar o setor

Em Minas Gerais, a Comissão de Administração Pública da Assembléia Legislativa realizou uma audiência pública, no início do mês, com representantes dos órgãos que lideram as reclamações que chegam aos gabinetes dos parlamentares. A principal queixa é em relação a demora nas nomeações e nos preenchimentos das vagas anunciadas nos editais dos concursos. Na ocasião, foi apresentada uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que, de acordo com o autor, o deputado Elmiro Nascimento (DEM), obrigaria o poder público ou órgão responsável pelo concurso a preencher as vagas anunciadas antes que o prazo de validade do processo de seleção expire.

De acordo com o deputado, o poder do administrador público de nomear quando quiser, dentro do prazo previsto, seria preservado, ¨O que se exigirá é que, ao convocar concurso, o administrador discrimine o número de vagas dentro da realidade, o que evitaria que os concursos sejam usados como fonte de recursos ou como instrumento político em época eleitoral ¨, justifica o deputado. A PEC aguarda a nomeação de uma comissão especial que fará um relatório e a encaminhará para votação em plenário.

A diretora-executiva da Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac), Maria Thereza Sombra, explica que a demora ou até mesmo a não convocação de candidatos aprovados é mais comum do que se imagina. A administração pública, principalmente municipal, abre edital com previsão de vagas, dentro do orçamento atual, mas o concurso demora muito até ser homologado. Muitas vezes os recursos não estão mais disponíveis e tem que esperar a autorização da Câmara ou da Assembléia para abrir o orçamento. Isso acontece especialmente com concursos realizados no segundo semestre, quando há transição de governos e não dá mais para chamar ainda no exercício , afirma.

A diretora esclarece que os concursos têm validade de até dois anos, prorrogáveis por igual período, e que não pode haver outro concurso durante esse período para os mesmos cargos, nem a contratação de terceirizados. Para resolver alguns problemas recorrentes e regulamentar os concursos, a Anpac vai levar a Brasília o Estatuto do Concurso Público, que pretende normatizar o setor, evitando omissões e erros como o fato de as taxas de inscrições serem muito altas e algumas provas importantes serem aplicadas no mesmo dia , conclui.

Saiba mais

Para a diretora executiva da Anpac, Maria Thereza Sombra, o candidato com chances de passar em um concurso público tem que freqüentar curso preparatório e ter a ajuda de livros especializados. Em média, estudar 10 horas por dia, durante um ano, gastando mais ou menos R$ 300. De acordo com Maria Thereza, somente 5% das pessoas que fazem concurso estão em cursos preparatórios, exceto em cargos jurídicos e fiscais, quando a situação se inverte: 80% dos candidatos estão nos cursinhos

Para o advogado e professor Marcelo Burgel, uma boa preparação demanda pelo menos uma aula semanal de direito durante três meses, uma aula semanal de produção e interpretação de textos durante um mês e quatro aulas semanais de gramática, também durante um mês. Depois disso, o tempo de estudos em casa é acelerado, pelo fato de o candidato ter fixado a matéria, com exercícios e provas de concursos anteriores. A dica é não esquecer do tempo para o lazer e para o descanso

O número de contratações no serviço público por meio de concursos subiu de 13.028 para 21.623, de acordo com a Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos (Anpac). A previsão é de que até 2015 sejam criadas 250 mil vagas apenas na esfera federal. A maior parte dessas vagas vem da substituição de contratados terceirizado

Concursos com editais publicados

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
404 vagas para procurador federal, nível superior
Inscrições no endereço eletrônico www.concursosfcc.com.br (até dia 27)
Salário: R$ 10.497,56
Taxa de inscrição: R$ 88

CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO PAULO
197 vagas para níveis fundamental, médio e superior
Inscrições no site www.vunesp.com.br (de 30 de maio a 15 de junho)
Salários: R$ 755,66 a R$ 5.137,57
Taxas de inscrição: R$ 21 e R$ 51

CÂMARA DOS DEPUTADOS
148 vagas para níveis médio e superior
Inscrições no site www.concursosfcc.com.br (de 11 a 21 de junho) ou nas agências credenciadas da Caixa Econômica Federal (de 11 a 22 de junho)
Salários: R$ 3.252,22 e R$ 9.008,12
Taxas de inscrição: R$ 80 e R$ 123

CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL (CRESS)
6 vagas para níveis médio e superior
Inscrições no endereço eletrônico www.examesconsultores.com.br (até 4 de junho ou na sede do CRESS, Rua Tupis, 485, sala 502, Centro, BH, até 1º de junho)
Salários: R$ 401,94 a R$ 1.912,29
Taxas de inscrição: R$ 35 e R$ 50

MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS
30 vagas para promotor de Justiça substituto, nível superior
Inscrições até dia 17 no site www.mp.mg.gov.br
Taxa de inscrição: R$ 200

SECRETARIA DE ESTADO DE FAZENDA DE MINAS GERAIS
800 vagas para níveis médio e superior
Inscrições no endereço eletrônico www.nce.ufrj.br/concursos (até 8 de junho ou pessoalmente até o dia 31 nas agências dos Correios)
Salários: R$ 930 e R$ 2.200,80
Taxas de inscrição: R$ 30 e R$ 45

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS 2ª INSTÂNCIA
762 vagas para níveis médio e superior
Inscrições até dia 17 no site www.fundep.ufmg.br/concursos
Taxas de inscrição: R$ 40 e R$ 60
Salários: R$ 1.492,79 e R$ 2.337,78

Fonte: Jornal Diário da Tarde.
(Incluída em 14/05/2007 às 09:00)

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